Artigo: O bode expiatório social

Muito se tem falado em redução da maioridade penal, mas pouco se tem provado sobre a eficácia dessa Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Ocorre que, ser a favor desse projeto rende aos parlamentares um bom índice de popularidade e, com isso, relativa garantia de recondução ao cargo.

Os favoráveis ao “antiprojeto” social afirmam que os adolescentes já possuem discernimento sobre seus atos e, portanto, devem pagar por crimes cometidos. Concordo. Acontece que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) já prevê a responsabilidade de qualquer delito cometido por adolescentes a partir de 12 anos. Assim, o adolescente inimputável, de acordo com o Estatuto, não fica impune, uma vez que há previsão de medidas socioeducativas como advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e, óbvio, a internação.

Essas medidas são cumpridas em unidades mais bem preparadas que o sistema penitenciário “falido” brasileiro. Basta comparar os índices de reincidência em ambos os casos: no sistema prisional, ultrapassa 70% e, no sistema socioeducativo, não chega a atingir 20%.

Desta forma, o ingresso precoce de adolescentes no nosso sistema carcerário só faria aumentar o número de marginalizados e, consequentememente, os índices de violência, pois tornaria muitos deles distantes de qualquer medida socioeducativa.

Tomar o jovem infrator como responsável por parte do fenômeno da violência de nossa sociedade, é utilizá-lo como bode expiatório que beneficia a quem, senão aos próprios parlamentares ávidos de poder?!!!

Se a ideia, então, é punir com o intuito de reduzir a violência no Brasil, como se explica o fato de os Estados Unidos da América (EUA), onde alguns Estados chegam a adotar a pena capital, liderarem o ranking mundial de presidiários no mundo com 2,2 milhões de presos? Simples, não há relação direta entre a adoção de soluções punitivas e repressivas e a diminuição dos índices de violência. Contudo, ações de cunho social demonstram eficácia na reinserção social do menor infrator.

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dos 90 mil casos de “jovens infratores”, 30 mil cumprem medidas socioeducativas, o que representa somente 0,5% da população jovem do país. Desta forma, podemos alterar a Constituição com base na exceção? A resposta é negativa, pois o direito é universal.

Além disso, mais um fator se interpõe: caso aprovada a emenda no Congresso Nacional, a administração pública não conseguirá cumprir com a nova normatização. Basta observar os dados do Departamento Penitenciário Nacional que informa um déficit de 198 mil vagas no sistema penitenciário, ou seja, muitos detentos não dispõem dos seis metros quadrados de espaço previstos por lei.

O Estado é omisso desde a origem. O menor infrator é resultado do descaso do Estado que deveria prevenir o cometimento do crime, ofertando uma educação de excelência para inserir socialmente o jovem, mas, ao invés disso, conta com 10% da população com escolaridade inferior a um ano, favorecendo a criminalidade juvenil.

Com base nisso e mais uma gama de fatores, sou contra a redução da maioridade penal porque o gradiente de criminalidade não é responsabilidade do menor. A responsabilidade é da Administração Pública que, esta sim, deveria ser penalizada por seu atestado de incompetência.

Professor Otávio Barreto

Diretor do SINPROEP-DF

Foto: reprodução

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